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Aos 25, uma pequena revisão.

Não sei o que fiz até hoje a ponto de não me dar conta. Aos 25 anos, a vida é diferente. Falo por mim, quem sabe do outro. Aliás, o outro é tudo quanto vem me distraindo esses últimos anos. Quando as amigas diziam que a minha vida era perfeita, eu me despreocupava, menosprezando querelas essenciais. Como se perfeição durasse mais que um instante. Quando os amigos diziam que eu era responsável, eu acreditava. Como se o que vissem fosse o conjunto completo, que, podem apostar, de contradições está farto. Quando a família dizia que eu era inteligente, eu me esforçava menos, porque supostamente não precisava. Quando os meninos me elogiavam, eu abria mão da maquiagem. Como se para ser original eu precisasse ser natural – e pálida. Assumo a responsabilidade pelos enganos cometidos, mas a questão a esclarecer agora é: quem me tornei de verdade?

Caixinhas são, para mim, o único objeto passível de valer uma coleção. Quero delas um milhar, para preservar minhas descobertas e lembranças de viagens e de amores finitos. Na velhice, também para guardar remédios com dignidade. Concentrar pílulas de memórias em um recipiente. Só abrir e suspirar. Certa vez, disse para um rapaz que gostaria de guardá-lo numa dessas. Eu podia resgatá-lo para saciar a saudade e ainda sempre que precisasse respirar. Ele não quis. Acho que me deu isso de adorar caixinhas quando minha avó contou a história da Dona Baratinha. Enquanto arrumava a casa, ela achou uma moedinha. Se pôs bonita e passou a ficar em sua janela, cantando “quem quer casar com a Dona Baratinha, que tem fita no cabelo e dinheiro na caixinha?”. Arranjou vários pretendentes, mas cada um fazia um barulho mais assustador à noite. O único quietinho era o Dom Ratão, que ela escolheu como parceiro. No dia do casamento, porém, ele foi xeretar a comida na cozinha e se afogou na panela de feijão. Reforço o desfecho, desapontando quem esperava outro: o noivo morreu, ponto. Desconsolo infantil.

Levantei os braços para o alto e cantei. Passei bem os últimos anos; aventureira curiosa, entusiasmada. E, logo agora, em plena passagem para o próximo quarto de vida, fui pega em cima do muro. Igual ao Obama, que de tanto se equilibrar só se dá mal. De que vale ganhar o prêmio da Paz, se é para perder mais que todos os lados? O defendo com dentes, mas percebo a lição. E sinto que estou atrasada, feito o coelho da Alice, de colete e cartola, segurando um antiquado relógio de bolso. É tarde, é tarde, é tarde! Aos 25, é tarde para não decidir, apesar de ser cedo para ter certeza. Brincar de casinha, uma mochila nas costas, abrir um negócio, viver de salário, salvar o mundo, cuidar da família. Ter 5 filhos, e nos levarmos à loucura. É tarde para ser amadora. Nada de ficar tateando. É hora de ir fundo, definir itens para cumprir todos os dias. Como em um casamento, suponho, escolher a mesma pessoa a cada manhã. Quais as manias inaceitáveis, quais são toleráveis, desejáveis, charmosas até. Dei-me conta que o que eu quero é ainda coisa demais e não vai caber. É hora de assumir um partido, a playlist, o jornal predileto, vestido curto, a turma preferida, o destino – praia, campo, Londres ou Havaí – o que combina, o que não dá.

Isso porque ainda é cedo para pensar na morte. Curvar as costas e mirar o chão em vez do horizonte. Sou nova para ser amarga e velha para ser revoltada. É tarde para ficar alheia às responsabilidades, usar um fone de ouvido o tempo todo pendurado na orelha. É tempo bom para fazer o que quero e acreditar em tudo o que faço. Hora de ser original, pois também ficou tarde para copiar. Hora propícia para me tornar. Rockeira, amélia, astronauta, comediante, camareira. Preciso de um projeto a longo prazo, caso eu ganhe a loteria. Desejava estar em plena prática. Mas agora estou ocupada construindo uma ponte estaiada para unir as linhas da vida e do amor, que descobri não se cruzam na minha mão. (Ai, se dos últimos natais Papai Noel não existir fosse a pior notícia…) Aos 25 anos, é tarde e cedo para aceitar.